a Quarta-feira de Cinzas é considerada a "porta" da Quaresma. De
fato, a liturgia e os gestos que a distinguem formam um
conjunto que antecipa de modo sintético a própria fisionomia de todo o
período quaresmal.
"Convertei-vos
a mim de todo o vosso coração com jejuns, com lágrimas, com gemidos".
(Joel 2,12). Os sofrimentos, as calamidades que afligiam naquele tempo a
terra de Judá estimulam o autor sagrado a encorajar o povo eleito à
conversão, isto é, a voltar com confiança filial ao Senhor dilacerando o
seu coração e não as vestes. De fato, recorda o profeta, ele "é
clemente e compassivo, paciente e rico em misericórdia e se compadece da
desgraça" (2, 13). O convite que Joel dirige aos seus ouvintes também é válido para nós.
Não
hesitemos em reencontrar a amizade de Deus perdida com o pecado;
encontrando o Senhor experimentamos a alegria do seu perdão. E assim,
quase respondendo às palavras do profeta, fizemos nossa a invocação do
refrão do Salmo 50: "Perdoai-nos Senhor, porque pecamos". Proclamando, o
grande Salmo penitencial, apelamo-nos à misericórdia divina; pedimos ao
Senhor que o poder do seu amor nos volte a dar a alegria de sermos
salvos.
Com
este espírito, iniciamos o tempo favorável da Quaresma, como nos
recordou São Paulo: "Aquele que não havia conhecido o pecado, diz ele,
Deus o fez pecado por nós, para que nos tornássemos, nele, justiça de
Deus" (2 Cor 5, 21), para nos deixarmos reconciliar com Deus em Cristo
Jesus. O Apóstolo apresenta-se como embaixador de Cristo e mostra
claramente como precisamente através d'Ele, seja oferecida ao pecador,
isto é a cada um de nós, a possibilidade de uma reconciliação autêntica.
A liturgia da Quarta-feira de Cinzas indica assim na conversão do
coração a Deus a dimensão fundamental do tempo quaresmal. Esta é a
chamada muito sugestiva que nos vem do tradicional rito da imposição das
cinzas, que daqui a pouco renovaremos. Rito que assume um duplo
significado: o primeiro relativo à mudança interior, à conversão e à
penitência, enquanto o segundo recorda a precariedade da condição
humana, como é fácil compreender das duas fórmulas diversas que
acompanham o gesto.
Amados irmãos e irmãs, temos quarenta dias para aprofundar esta
extraordinária experiência ascética e espiritual. No Evangelho (cf. Mt
6, 1-6.16-18), Jesus indica quais são os instrumentos úteis para
realizar a autêntica renovação interior e comunitária: as obras de
caridade (a esmola), a oração e a penitência (o jejum). São as três
práticas fundamentais queridas também à tradição hebraica, porque
contribuem para purificar o homem aos olhos de Deus.
O jejum, ao qual a Igreja nos convida neste tempo forte, certamente
não nasce de motivações de ordem física ou estética, mas brota da
exigência que o homem tem de uma purificação interior que o desintoxique
da poluição do pecado e do mal; que o eduque para aquelas renúncias
saudáveis que libertam o crente da escravidão do próprio eu; que o torne
mais atento e disponível à escuta de Deus e ao serviço dos irmãos. Por
esta razão o jejum e as outras práticas quaresmais são consideradas pela
tradição cristã "armas" espirituais para combater o mal, as paixões
negativas e os vícios.
Pedimos a Maria que nos acompanhe para que, no final da Quaresma,
possamos contemplar o Senhor ressuscitado, interiormente renovados e
reconciliados com Deus e com os irmãos.
Fonte: Arautos do Evangelho
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