O caminho quaresmal deve nos levar à conversão, penitência e misericórdia
“Chegaram algumas pessoas trazendo a Jesus notícias a respeito dos
galileus que Pilatos tinha matado, misturando o sangue deles com o dos
sacrifícios que ofereciam. Ele lhes respondeu: ‘Pensais que esses
galileus eram mais pecadores do que qualquer outro galileu, por terem
sofrido tal coisa? Digo-vos que não. Mas se vós não vos converterdes,
perecereis todos do mesmo modo. E aqueles dezoito que morreram quando a
torre de Siloé caiu sobre eles? Pensais que eram mais culpados do que
qualquer outro morador de Jerusalém? Eu vos digo que não. Mas, se não
vos converterdes, perecereis todos do mesmo modo'” (Lc 13,1-15).
Foto: Wesley Almeida/cancaonova.com
Alguém pode até pensar que se trata de crônica policial, com fatos
hoje corriqueiros e incapazes de nos assustar, tal a frequência de
massacres, violência e acidentes! Mas aqui se trata de uma proposta
séria de reação inteligente, baseada na fé, diante dos acontecimentos.
Não dá para passar ao largo de todas as muitas provocações vindas do dia
a dia, sem acolher a misteriosa e efetiva mensagem que Deus quer
efetivamente nos oferecer, exigindo nossa reação. Deus nos fala
continuamente e pede sempre o mesmo, a conversão, palavrinha provocante
que significa mudar de mentalidade e de rota.
Todos devem sair da confissão com alegria no coração
Mudar de mentalidade! A Campanha da Fraternidade em curso remete os
cristãos que dela participam e apela a todas as pessoas de boa vontade
ao cuidado com a nossa casa comum, a partir do intrigante tema do
saneamento básico. Impressiona o fato de que se torna necessário que os
responsáveis pela vida eclesiástica tenham de vir a público, quase a
suplicar que alguém se desperte e tome providências efetivas quanto ao
cuidado com a água, o recolhimento do lixo, o esgoto sanitário e daí por
diante! São elementos tão “escondidos” até debaixo da terra, cujo
cuidado já deveria ser dado por descontado pela cidadania e pelos
responsáveis pela administração pública! Só que a mente precisa ser
mudada para que as ações a ela correspondam. O bem dos outros e o bem
comum, no qual cada um de nós está incluído, há de passar na frente do
escandaloso prazer de sujar ruas e praças ou desperdiçar água ou ainda
destruir o patrimônio público! Mais ainda, há de mudar a banalização da
vida, vilipendiada e destruída diante dos olhos de todos.
Podemos ir mais a fundo na questão, com a coragem de perguntar ao
conjunto da sociedade a respeito dos motivos para tanta inversão de
valores! É que começamos a plantar há muito tempo. Quando Deus deixa de
ser o centro e o polo de referência, todo o resto desmorona. O ser
humano, a natureza ou qualquer outro ideal, jogam fora o próprio
sentido, quando Deus é excluído! Não somos fruto do acaso. Quando a
humanidade “escolheu o acaso”, gerou o individualismo, espalhou-se como
relativismo, confundiu as peças do tabuleiro da sociedade e da vida!
Reconstruir tudo, ajuntando os cacos, já está dando trabalho e pedirá
muito esforço do conjunto da sociedade.
A Palavra de Deus e a experiência sofrida e maravilhosa dos cristãos
suscitaram alguns passos. É incrível, mas começa quando paramos, tomamos
consciência de nossos inúmeros erros, temos a coragem de reconhecê-los
como “pecados”, descobrimos que prejudicar os outros ou a própria vida e
ainda a natureza toca na raiz de nossa existência! E lá vai o pecador,
arrependido e suplicante, corajoso para se enrubescer de vergonha no
confessionário, pedir perdão e sair disposto a recomeçar pela enésima
vez, levantar a cabeça e melhorar! Vem da sabedoria do Papa Francisco
uma magnífica palavra: “A confissão não deve ser uma tortura. Todos
devem sair da confissão com a alegria no coração, com o rosto radiante
de esperança, mesmo se, às vezes, como sabemos, molhado pelas lágrimas
da conversão e da alegria”. Sim, o mundo já mudou para melhor quando
alguém começou a ser diferente!
Ao sair da confissão é preciso mudar de rota
Ao sair dos muitos confessionários à disposição, trata-se de mudar a
rota! Começar a amar o próximo que está ao nosso redor, tratar os bens
da natureza com maior carinho, privilegiar o bem que é feito, diminuir a
amargura com a qual se comentam os fatos da sociedade, fazer menos
propaganda dos crimes correntes, relatar experiências positivas,
participar de iniciativas comunitárias, quem sabe reaprender a sorrir e
cumprimentar com maior delicadeza, fazer-se um com os outros, sem
pretender justificar as opções egoístas de quem quer ficar “na sua” e
ainda afirma que ninguém tem nada com isso!
A quem considera irreais tais propostas, aqui está o resto da
conversa de Jesus, por sinal à disposição dos interessados nas Missas do
terceiro domingo da Quaresma. Vale a pena acolhê-la e ainda ir à Missa
para ouvir a Boa Nova proclamada e celebrada na Igreja: “Jesus contou
esta parábola: ‘Certo homem tinha uma figueira plantada na sua vinha.
Foi lá procurar figos e não os encontrou. Então disse ao agricultor: ‘Já
faz três anos que venho procurando figos nesta figueira e nada
encontro. Corta-a! Para que está ocupando inutilmente a terra?’ Ele,
porém, respondeu: ‘Senhor, deixa-a ainda este ano. Vou cavar em volta e
pôr adubo. Pode ser que venha a dar fruto. Se não der, então a
cortarás'” (Lc 13, 6-9). O tempo não perdoa quem não o respeita! Há que
aproveitá-lo e transformá-lo em oportunidade de salvação. Não
desperdiçar a paciência de Deus, que oferece de tudo para o nosso
crescimento e a conversão. Fazer penitência para afofar a terra de nosso
coração, acreditar nas graças que são oferecidas! Temos tempo!
Peça a Deus o dom das lágrimas, o dom da conversão
Há poucos dias, em Ciudad Juarez, no México, o Papa Francisco,
referindo-se à pregação do profeta em Nínive, assim se expressou: “Jonas
ajudou a ver, a tomar consciência. Que se passa depois? O seu apelo
encontra homens e mulheres capazes de se arrependerem, capazes de
chorar: deplorar a injustiça, deplorar a degradação, deplorar a
opressão. São as lágrimas que podem abrir o caminho à transformação; são
as lágrimas que podem abrandar o coração, são as lágrimas que podem
purificar o olhar e ajudar a ver a espiral de pecado em que, muitas
vezes, se está enredado. São as lágrimas que conseguem sensibilizar o
olhar e a atitude endurecida, sobretudo adormecida perante o sofrimento
alheio. São as lágrimas que podem gerar uma ruptura capaz de nos abrir à
conversão. Foi assim com Pedro, depois de ter renegado Jesus; chorou e
as lágrimas abriram-lhe o coração. Hoje, essa palavra ressoa
vigorosamente no meio de nós; essa palavra é a voz que clama no deserto e
nos convida à conversão. Neste Ano da Misericórdia, quero implorar
convosco, neste lugar a misericórdia divina, pedir convosco o dom das
lágrimas e o dom da conversão”. Pedindo o dom da conversão, deixemo-nos
envolver com o manto da misericórdia!
Fonte: Canção Nova
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